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quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Arthur Moreira Lima: cultura para todos

“Este tipo de concerto promove uma inclusão social muito grande. É um encontro de toda a sociedade”, Moreira Lima

Irati – Um piano, um caminhão, um grande músico e o público, estes foram os principais elemen-tos que marcaram o último sába-do (13) em Irati. A apresentação do pianista clássico, Arthur Mo-reira Lima, atraiu cerca de 1600 pessoas de várias gerações na Rua Benjamin Constant, em frente a construção do Centro Cultural Denise Stoklos.
Natural do Rio de Janeiro, Arthur Moreira Lima começou a estudar piano aos seis anos, aos nove já tocava um concerto de Mozart com a Orquestra Sinfônica Brasileira. Seus mestres foram Lúcia Branco (Rio de Janeiro), Marguerite Long (Paris) e Rudolf Kehrer (Conservatório Tchaiko-vsky de Moscou).

O pianista conta que a ideia de promover concertos ao ar livre começou quando era subsecre-tário da Cultura na última gestão de Leonel Brizola como gover-nador do Rio de Janeiro (entre 1991 e 1994). Responsável pelo interior do estado, Moreira Lima começou a promover nestes municípios menores, concertos ao ar livre com outros músicos que tocavam os mais variados estilos musicais.
“Aqueles palcos não eram bem montados, tinham a armação toda em madeira e quando você entrava para tocar ficava com medo de cair. Então, tive a ideia de montar o concerto no caminhão porque fica mais bonito, passa a impres-são de um teatro. Também lembro que os concertos custavam caro para as prefeituras, hoje não, os custos são menores e o caminhão dá mais mobilidade. Com esse caminhão já dei dois concertos no mesmo dia em duas cidades em Alagoas, por exemplo. Consegui-mos montar e desmontar tudo muito rápido com toda parafer-nália de som, luz e telão”, observa o pianista.
Ao longo de quatro anos e depois de muitos concertos, Moreira Lima foi aos poucos aperfeiçoando o caminhão, fez visitas a fábricas de carrocerias e contratou um engenheiro para montar o projeto do seu caminhão-teatro. “Foi difícil começar a tocar com o caminhão, porque muitas pessoas não entendiam o que era o meu projeto. Muitos quando eu dizia que era um piano num caminhão, já imaginavam um caminhão desses de feira com carroceria de madeira e um piano de armário. Mas isso aqui é um teatro sobre rodas com toda a estrutura necessária, inclusive camarim e banheiro”, completa.
O pianista recorda um episódio em que tocou numa pequena cidade do Nordeste e que ao ligar as luzes do caminhão-teatro, apagou-se a luz de todo o municí-pio. Nesta época, o caminhão era ligado a energia elétrica das cidades, hoje conta com um caminhão auxiliar que tem gerador próprio. 17 pessoas fazem parte da equipe que viaja todo o Brasil levando o som do piano de Moreira Lima. “A equipe que me acompa-nha é muito boa, porque dá muito trabalho correr atrás de patrocínios, das cidades em que vamos fazer os concertos, organizar o itinerário e combinar as datas. O mais fácil é chegar ao palco e tocar”, considera.
Apesar de realizar concertos em pequenas cidades do interior do Brasil, Moreira Lima é um pianista conhecido e premiado em todo o mundo. Sua carreira internacional projetou-se primeiramente no Concurso Chopin de Varsóvia em 1965. Logo depois se consagrou também nos Concursos de Leeds (Inglaterra, 1969) e Tchaikovsky (Moscou,1970). Desde então, fez turnês e lotou as principais salas de concertos do mundo. Entre as orquestras famosas com quem já se apresentou estão as Filarmô-nicas de Leningrado, Moscou e Varsóvia, e as Sinfônicas de Berlim, Viena, Praga, BBC de Londres e National da França.
Porém, o pianista compara os ambientes fechados destes concer-tos a uma sala de operação. “Em locais fechados o silêncio é absoluto, um ambiente extremamente formal, muito contrito, como uma sala de operação. Não há comunicação com o público, você chega e toca, acho que este formato tende a mudar. Devo fazer uma série de concertos em Nova Iorque em 2011, e está se planejando algo um pouco diferente, com mais interação com o público. È necessário falar com as pessoas e dizer o que é que vai ser tocado, porque ninguém tem obrigação de saber tudo”, propõem Moreira Lima.
Esta visão que o pianista tem acerca dos concertos foi influenciada pelas apresentações que fez em fábricas no período em que morou na União Soviética. Moreira Lima lembra que em todos os concertos uma pessoa explicava aos operários o repertório, e que embora as condições de acústica e o piano fossem ruins os trabalhadores ficavam extremamente felizes com as apresentações. “Isso mudou minha mentalidade ao perceber o retorno que há quando você explica e faz um programa acessível a todos”, relata.
Segundo o pianista, tocar em pequenas cidades e ao ar livre exige preparação, concentração e uma proposta de repertório totalmente diferentes daquelas exigidas nos palcos internacionais. “Já toquei em lugares infinitamente pequenos e é emocionante levar isso até essas pessoas. O interior do Brasil é muito rico do ponto de vista humano, o público é muito receptivo. Este tipo de concerto promove uma inclusão social muito grande. É um encontro da sociedade, você vê as crianças, o prefeito da cidade ao lado do mendigo que vê e para. Isso é sensacional e gosto muito mais. Fiz concertos na Europa e nos Estados Unidos, e queria muito voltar para o Brasil para fazer isso”, enfatiza Moreira Lima.
Para manter o projeto “Um Piano pela Estrada”, o pianista conta com o apoio do Governo Federal, através do Ministério da Cultura, da Caixa Econômica Federal, da Gerdau e dos Correios. Para ele, há no Brasil atualmente pessoas que estão interessadas em distribuir não só a riqueza material, mas também a riqueza cultural. “Nós que tivemos a sorte de estudar, frequentar uma universidade, temos isso como obrigação espalhar a cultura e a assistência para todos os nossos irmãos. Temos que saber e exercitar a nossa cidadania. Mais que direito a ela, temos o dever de exercê-la”, acrescenta.
A valorização e estímulo da cultura para Moreira Lima é essen-cial porque ela fortalece a cidadania e exerce influência em tudo, até na maneira do cidadão votar. Ele julga que comparada com outros setores da administração pública como obras e saneamento, a cultura é muito barata e traz como retorno o enriquecimento do espírito de cidadão. “É importante que a pessoa participe da vida do país, tudo tem que ser reivindicado. Ninguém constrói algo novo de uma hora para outra, nós estamos há 500 anos tentando melhorar o país e agora nós tivemos um surto de progresso muito grande, e compete a todos tentar prolongar o máximo possível isso. Quando eu era garoto ninguém sabia onde ficava o Brasil e hoje ele tem a sua voz ouvida no mundo inteiro. Hoje é através de todas as nossas manifestações culturais que somos conhecidos”, encerra o pianista.

TEXTO E FOTO: MARINA LUKAVY

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